segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Por um laço de fita...


Gosto muito de passear pelo site Domínio Público. É um ambiente recheado de coisas interessantes - e, o melhor: disponíveis para download! Fico a procurar obras dos meus autores prediletos. Outro dia, eu acessei a página em busca de obras de Castro Alves, meu amor platônico. Baixei a obra Espumas Flutuantes. Um deleite a cada verso, a cada estrofe, a cada poema.
Em um momento da leitura meus olhos pousaram sobre o poema O Laço de Fita. Mais um suspiro, desta vez bem longo e profundo. Fiz uma viagem no tempo. Voltei aos meus onze anos de idade. Propaganda partidária... Um livro com a capa meio azul-esverdeada... Um poema... Um poeta...
Eu estava de férias em Amargosa, devia ter uns onze anos de idade - não me lembro ao certo. Seria mais uma noite como outra qualquer. Após um dia inteiro de aventuras e pedaladas, de pega-pega e esconde-esconde; um banho e todo mundo – eu e meus primos – em volta da tv para assistir novela. Trivial.
Atenção para o verbo?! Seria mais uma noite como outra qualquer. Seria... Findo o jornal, o anúncio: propaganda partidária obrigatória. Puxa vida!Propaganda partidária obrigatória! Não eram tão hilárias quanto as de hoje; ou talvez fossem e eu agora não me lembro; ou talvez fossem, mas a minha falta de conhecimentos na área de política não me permitissem compreender as piadas na época. Pois bem. Eu não tinha a menor vontade de assistir aquela falação. Acho que os outros também não tinham, já que a televisão foi desligada. Eu necessitava fazer algo que me distraísse, que ajudasse a passar o tempo.
Na sala da casa da minha tia havia uma estante com vários livros arrumados na prateleira mais alta, dentre eles uma coleção de antologias poéticas com textos da literatura alemã, inglesa e portuguesa.
Ler. Por que não? A estante piscava para mim.
Motivada por alguma coisa da qual não me lembro agora, peguei os livros meio azul-esverdeado – a coleção de antologias poéticas – e sentei-me no chão com eles no colo. Folheei, folheei, folheei, até me deter no volume de literatura portuguesa. Passei o olho em alguns versos, li outros, e me enrosquei em um laço de fita.
O laço de fita, de Castro Alves, que texto mais lindo! Quanta delicadeza, quanta sensibilidade, quanto afeto! Em minha imaginação, o laço de fita ganhava características de borboleta: leve, colorido, pululante, cheio de vida. Ah!Em minha imaginação ele era rosa. Como era possível falar de amor daquele jeito!? Como era possível... Um simples laço de fita, um simples objeto... Apesar de namorar palavras, ainda não tenho intimidade suficiente com elas para tornar comunicável o que o poema me causou e o que essas lembranças me fazem sentir agora.
Ao final daquelas férias, levei um dos livrinhos meio azul-esverdeados comigo. Em minha casa, copiei vários poemas de Castro Alves no meu diário - afinal, uma hora teria que devolver o livrinho aos seus donos, e eu já não conseguia viver sem aquelas palavras.
Visitas a uma biblioteca pública me mostraram outros poemas de Castro Alves e outros poetas. Na escola, estudar literatura ganhou outro sentido para mim. Tornou-se um dos meus assuntos preferidos. Cada vez mais eu gostava de poesia, comecei até a rabiscar uns versos. Hoje gosto de muitos poetas, porém a minha dileção por Castro Alves permanece. Seus versos estão na minha agenda, no meu armário, na minha memória, na minha vida.
Recentemente, em casa de minha tia, revisitei o livro meio azul-esverdeado. Surpresa: não encontrei O laço de fita. Olhei o livro de ponta a ponta; todas as páginas estavam no lugar, e nenhum laço de fita. Acho que me embaralhei em minhas lembranças...
Talvez, ou melhor, provavelmente tenha me aproximado de Castro Alves por outros poemas contidos no livrinho, mas foi O laço de fita, com certeza, que me fez cativa dele definitivamente. Um cárcere no qual a prisioneira deseja manter-se presa ao seu carrasco. O laço de fita prendeu Castro Alves, e Castro Alves prendeu-me à poesia com seu laço de fita.

Um comentário:

Mônica Paz disse...

Emocionante o seu texto, linda a sua relação com a literatura, pena não termos isso em comum. beijos