domingo, 24 de outubro de 2010

Sem fio

Quarta-feira à noite. Salvos da prova por um triz. A notícia de que o professor não viria dar aula foi um verdadeiro presente dos deuses, e digno de comemoração.
Decidiram comemorar tomando chopp em um barzinho perto da faculdade. Na mesa, casados, solteiros e enrolados bebiam e riam. E entre uma besteira e outra, ela viu aquela verdadeira aparição entrar no bar com uma mochila nas costas. Pele bronzeada, cabelos grisalhos, jeans e camiseta. Pinta de George Clooney com charme de Richard Gere. Perfeito!
Ela, apesar de fedelha, tinha uma queda por homens maduros.
Ouvidos na conversa da mesa, olhos atentos ao movimento da aparição.
Ele sentou-se em uma mesa num canto mais reservado e cumprimentou o garçom que, minutos depois, voltou com uma garrafa de vinho. Ele parecia tranquilo, e não dava sinais de estar esperando alguém. Abriu a mochila, pegou um notebook, pôs sobre a mesa e em seguida conectou um modem de internet móvel.
Ela maquinava uma forma de chamar-lhe à atenção, de se aproximar, de puxar conversa. Ele estava com o rosto iluminado pelo brilho da tela do computador. Ela continuava maquinando e olhando...
Repentinamente, ele esboça um sorriso.
Sorriso para ela? Não, para a tela!
Ele sorria, escrevia, gesticulava; gesticulava, escrevia, sorria. E ela? Ela nada entendia e não acreditava no via: agora era um brinde!! Só faltou dizer saúde (ou será que ele escreveu?) Brindar com a tela do computador??? Como assim??? "Ei, olá, tem gente aqui, óóó!! Ao vivo e a cores!!!" era o que ela tinha vontade de dizer.
Nocauteada por um computador, e ela não teve a menor chance. Nem sequer um olhar foi trocado.
E o que mais a intrigava era aquele sorriso de orelha a orelha que ele tinha no rosto. Era o fim!
Além de ter uma queda por homens mais velhos, ela também era muito curiosa. Qual era o motivo daquele sorriso? Quem recebeu aquele brinde? Era uma questão de honra saber.
Ela levantou-se e foi em direção ao banheiro, por sorte, poderia passar perto da mesa e olhar pelas costas dele o que tanto fazia no computador...
Janela de um mesageiro instantâneo aberta, webcam ligada, uma chamada de vídeo e uma mulher  com uma taça do outro lado da tela (quem sabe do outro lado do mundo!!!!).
Só restava beijar a lona. 
Um homem com um notebook em um bar e isolado do seu entorno, imune a todos os olhares e sorrisos.  Era melhor que ficasse em casa!!! E depois ainda dizem que a tecnologia aproxima as pessoas!!! Aproxima quem?? Conversa pra boi dormir.
Maldita internet móvel, maldita wireless, maldito mensageiro instantâneo, maldita webcam!!!
Golpe certeiro.
... e nas muitas tramas do tecido da vida, ela foi nocauteada por uma rede sem fio...


5 comentários:

Pseudo Universo disse...

sensacional o seu texto.

Erica Vittorazzi disse...

Ah Paulinha, gostei tanto do seu texto. Imagina se você fosse a moça com a taça de vinho em qualquer lugar do mundo, e o seu grisalho teve que viajar a trabalho? Adorei! Viva a internet móvel!!!


Beijos

Andre Mansim disse...

Paulinha, vc escreve bem. Muito claro as imagens que vc quer passar, parabens.

Júlia disse...

Adorei a forma que usou pra descrever um fato assim.
Gostei daqui, to seguindo!
Beijos.

Letícia Palmeira disse...

Oiê.

Gostei da verdade que vc escreveu. Homem bonito, com notebook e ainda brindando com mulher virtual. São os novos tempos. Pessoas fogem do combate. Mais fácil é fingir.

Bjo.